Berardi e Milazzo: crônica de um encontro
por Julio Schneider
colaboração de Marco Gremignai
Por ocasião da Fiera del Libro di Torino (Feira do Livro de Turim), em maio último, Daniele Alfonso nos trouxe algumas notícias sobre o "divórcio artístico" de Berardi e Milazzo (ver artigo - em italiano). Acrescentamos outras notícias, provenientes - indiretamente - do Brasil, para melhor enquadrar a situação.
Em janeiro de 1998, quando chegou às bancas da Itália o quarto "Albo Speciale" de Ken Parker, "Faccia di rame", roteiro e argumento de Giancarlo Berardi e desenhos de Ivo Milazzo e Luca Vannini, os leitores ficaram sabendo que aquela edição encerrava uma das mais importantes séries dos quadrinhos italianos. Muitos, até hoje, não acreditam nessa possibilidade, e preferem aceitar a idéia de que se trata apenas da enésima suspensão da publicação. Mais difícil era entender os motivos que levaram à separação da genial dupla de escritor e desenhista, justo eles que trabalharam juntos por mais de vinte anos. A imprensa especializada tratou o caso como um "divórcio artístico", e não faltaram especulações para o caso, houve inúmeras versões tentando encontrar os verdadeiros motivos deste "rompimento".
Uma particularidade, sobretudo, aguçou ainda mais a curiosidade de leitores e jornalistas, qual seja, o fato de ambos se apresentarem separadamente em eventos de quadrinhos. Na verdade, segundo a versão mais "otimista", era só uma maquinação do destino, pois Berardi e Milazzo haviam recebido novas - e distintas - encomendas da Sergio Bonelli Editore.
Berardi estava empenhado em tempo integral com sua nova criação, a personagem Julia. Em recente entrevista ao jornal brasileiro "Estado de São Paulo", Berardi afirmou que "Julia é o único projeto em que estou trabalhando, e não poderia ser diferente, porque me toma uma média de doze horas por dia, cinco dias por semana. Um ritmo bastante pesado, que espero poder diminuir com o passar do tempo e a consolidação da série".
Milazzo, por seu turno, estava envolvido na realização do "Texone" nº 13, tarefa de grande responsabilidade, levando-se em conta a importância da publicação, para a qual somente artistas considerados do primeiro time são convidados a participar. Também, estava empenhado com "Shado", uma edição da recém lançada série do personagem Magico Vento.
Os fãs de Rifle Comprido, enquanto isso, se perguntavam quando surgiria a ocasião para novamente se reunir a dupla, mas, aparentemente, não tinham esperanças. Talvez porque não tenham sabido que em Rapallo, no dia 28 de outubro do ano passado, esse encontro existiu de verdade :-) graças a uma feliz conjugação de particulares... De fato, Rapallo é próxima tanto de Gênova (onde mora Berardi) quanto de Chiavari (Milazzo); e em Rapallo está o Ristorante U Giancu do simpático aficionado Fausto Oneto (já citado nas páginas da uBC: ver artigo - em italiano). E qual teria sido o pretexto para esse encontro, para a presença do editor brasileiro Wagner Augusto do CLUQ? Bem, mais de um: principalmente o lançamento oficial da minissérie brasileira de Ken Parker (Onde morrem os titãs, série em 2 edições, 1000 exemplares numerados) e também a cerimônia de entrega oficial dos troféus HQMix, o maior prêmio do Brasil na área de quadrinhos. O prêmio aguardava para ser entregue aos autores desde 1994, e foram três os troféus de sua obra naquele ano: melhor desenhista, álbum de aventuras e projeto gráfico, todos pelo álbum especial da Editora Ensaio publicado naquele ano, com os episódios Os Cervos (Cuccioli) e Um hálito de gelo (Un alito di ghiaccio).
Os troféus de melhor desenhista e álbum de aventuras estavam de posse de Wagner Augusto, editor do CLUQ, desde 1995, quando esse representou os artistas durante a cerimônia de entrega. O troféu de projeto gráfico havia sido entregue à editora. Aqui cabe um esclarecimento: esta entrega pessoal dos prêmios a quem de direito, no caso de autores internacionais (internacionais em relação ao Brasil, naturalmente), pode ser considerada como um fato quase inédito. Na maioria das vezes, os troféus da premiação internacional não chegam às mãos de seus verdadeiros donos, pois os representantes ou editores se apropriam da peça alheia, tornando-a objeto de fetiche. Atitude que pode até ser explicada quando se trata de um fã, afinal, quem não gostaria de possuir um troféu que supostamente deveria pertencer ao seu grande ídolo? Anos antes, em 1988, Ken Parker foi premiado como Melhor Revista de Faroeste, mas seus autores nunca viram o troféu, e só ficaram sabendo da distinção recentemente :-) (realmente, nos últimos onze anos do Prêmio HQMix poucos foram os autores europeus que efetivamente receberam seus troféus...).
Voltando à festa de Rapallo: para confirmar o ambiente festivo de quando Berardi e Milazzo receberam os prêmios, eis uma foto - feita por Rosana van Langendonck, fotógrafa oficial do CLUQ, além de esposa de Wagner - que traz juntos os protagonistas da noite, Berardi e Milazzo, com Wagner e Oneto, numa atmosfera de amizade, alegria e cordialidade.
Fausto Oneto, Milazzo, Berardi e Wagner Augusto
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Ainda na sua recente entrevista, Berardi disse que "trabalhar com Ivo Milazzo foi um privilégio, porque ele é um grande desenhista. Nesse sentido, tive muita sorte, pois em trinta anos de carreira pude colaborar com alguns dos melhores narradores gráficos italianos e internacionais. No momento, nossas estradas estão divididas, mas quanto ao futuro, não excluo que, se houver uma ocasião interessante, ficarei bem feliz de reencontrar meu velho companheiro de aventuras". Simples frases de circunstância? O tempo dirá...
Para terminar, uma última notícia a propósito dos prêmios: no dia 19 de julho de 2000, por ocasião da 12ª edição do Troféu HQMix-Os melhores de 1999, entre tantos premiados destacam-se três: Graphic Novell Estrangeira (Tex, o homem de Atlanta, Mythos Editora), Melhor Minissérie Estrangeira (Ken Parker, Onde Morrem os Titãs, do CLUQ) e Valorização dos Quadrinhos (também do CLUQ). A entrega dos prêmios, uma estatueta do dinossauro Horácio, do desenhista Maurício, aconteceu no dia 26 de setembro, no Teatro São Pedro, no tradicional bairro da Barra Funda na capital paulista. Foi outra ocasião para ver Berardi e Milazzo de novo juntos, agora no Brasil? Bem, desta vez continuou sendo um sonho :-) e mais uma vez coube a Wagner representar os dois autores e receber o prêmio a eles destinado. Berardi manifestou assim sua alegria pelo novo prêmio: "Caríssimo Wagner, estou feliz por este reconhecimento; feliz sobretudo porque premia a tua confiança e espírito empreendedor! Quando recebê-lo, peço-te expressar minha simpatia e meu afeto pelos nossos leitores brasileiros".
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